sábado, 31 de julho de 2010

O sorriso e o refúgio

Eu te dei um último aceno com meu sorriso mais doce, antes que você percebesse que algo em mim havia mudado profundamente. Eu era outra pessoa agora, embora a essência da tríade que você bem conhecia permanecesse inalterada.

Meu lábios se abriram e mostraram um pedaço da minha alma - uma parte limpa e intocada, que eu reservara para poucos porque temia banalizar. Eu deveria ter algum segredo, ainda que a transparência fosse uma característica tão certeira nos quadros que me pintavam.

Mas que o meu segredo podia ser teu, isso não era novidade.
No momento em que me expus, parte do que eu sentia foi procurar um canto escuro para adormecer sem tensão, apreensão. Não era uma fuga. Era uma questão de refúgio.

Por isso eu me propus a manter tanta vida aprisionada em mim, mesmo com a certeza de que estaria me privando de um mundo que poderia ser nosso. E assim me guardei. Porque dificilmente você me veria inteira novamente, mesmo que o sorriso continuasse por lá. Porque nem tudo o que eu queria e premeditava era passível de acerto. Porque um dia, eu precisaria ir embora.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

O amor chegou atrasado

Que o amor chegou atrasado e podia ser tarde demais.
Que não se mostrou antes porque é movido a presunções, temores e verdades mentirosas.
Que podia ter tudo acontecido no momento errado, no contexto errado, no tempo errado.
Que os relógios não andaram juntos.
Que não conseguia entender um terço dos sentimentos e, às vezes, gostava de confundi-los.
Que o amor chegou atrasado e era, sim, tarde demais.
Que o tempo não parara para que pudesse decidir acertar.
Que temia a imperfeição da rotina.
Que temia estragar a vida que lhe brotava.
Que para todos parecia óbvio.
Que para ela, não era.
Que o amor chegou atrasado ela sabia.
Sabia que não. Sabia que sim.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Cada vez mais certeza

Quando os nossos olhos se cruzaram sem querer, eu soube que já te conhecia. Não de outras vidas, mas dessa, a última.
Lembrei que há pouco tempo compartilhávamos histórias, planos e cobertas. Que dividíamos medos e sonhos. Que ouvíamos cada murmurar um do outro, com a dedicação que move os apaixonados. Que nos distanciamos em um momento de fúria, mas que foi melhor assim.
Enquanto teus olhos fugiam, os meus ficaram. Porque eu queria saber, ao certo, que tipo de lembrança ainda morava em mim. E te vi se distanciar com a impressão de que me deixara com fiapos de agonia e medo, que aos poucos perdiam espaço para a certeza, mãe da racionalidade.
Dificilmente voltaríamos a conversar sobre nós, mas aquele foi um diálogo entre almas. Porque eu sei que por detrás do teu olhar tímido, havia um pedido de desculpas, uma retratação. Por detrás do meu, havia o consentimento, a serenidade de quem compreendeu tudo.
A lembrança que mais me angustia é a mesma que quero guardar pra sempre, só para me certificar de que amores não morrem, apenas adormecem e se calam. Eu consegui ver o mar e sentir a paz do nosso primeiro encontro, quase como um ritual obrigatório de adeus.
E se pouco a pouco eu já te permitia ir embora, ontem soube que não havia mais nada seu entre as minhas partes. Nem um soluço ou uma lágrima de desapego. Te agradeci, ainda com os olhos, por ter me dado a chance de me reencontrar.

*esse amor hoje vai pra nunca mais voltar*