quinta-feira, 30 de setembro de 2010
Se você não chegar
Se você não chegar em meia hora, juro que vou gritar bem alto lá fora. Sim, vou gritar seu nome. Não, não vou sentir vergonha. Que venham os vizinhos, que cheguem os curiosos. A vergonha é inimiga da saudade. E eu não posso esperar mais por você.
Se você não chegar em uma hora, vou te encontrar onde você estiver. Vou procurar nos bancos das praças. Vou tentar te achar nos bares, nos bailes. Vou esperar na porta da tua casa. Vou sentar no meio-fio até você se materializar.
Se você não chegar em uma semana, vai me encontrar perdida. Vou ficar sem rumo, sem norte. Porque você sabe como me guiar. Você sabe como me enfrentar. Você sabe como me encantar.
Se você não chegar no próximo mês ou no próximo ano, ou quem sabe na próxima década, vai me encontrar inerte por aí. Perdida no tempo e no espaço em que você se foi. Lamentando as páginas que você rasgou. Apoiada nos planos que você desfez.
Mas eu sei, sei que você vai chegar. E vai agir como se não houvesse ontem. Vai rir das mesmas piadas de sempre. Vai me abraçar e me proteger. E vai continuar me fazendo esperar. Quem sabe mais um ou dois dias. Uma semana, um mês, uma década. É esse o tempo de nós dois.
quarta-feira, 29 de setembro de 2010
Composição
terça-feira, 28 de setembro de 2010
Despedida (Rubem Braga)*
E no meio dessa confusão alguém partiu sem se despedir; foi triste. Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval — uma pessoa se perda da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. É melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito — depois apenas aconteceu que não se encontraram mais. Eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado — sem glória nem humilhação.
Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.
E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida; que a lembrança deles nos faz sentir maior a nossa solidão; mas que essa solidão ficou menos infeliz: que importa que uma estrela já esteja morta se ela ainda brilha no fundo de nossa noite e de nosso confuso sonho?
Talvez não mereçamos imaginar que haverá outros verões; se eles vierem, nós os receberemos obedientes como as cigarras e as paineiras — com flores e cantos. O inverno — te lembras — nos maltratou; não havia flores, não havia mar, e fomos sacudidos de um lado para outro como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil.
Ah, talvez valesse a pena dizer que houve um telefonema que não pôde haver; entretanto, é possível que não adiantasse nada. Para que explicações? Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes; o silêncio torna tudo menos penoso; lembremos apenas as coisas douradas e digamos apenas a pequena palavra: adeus.
A pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo.
* Obrigada, Rubem Braga, por dizer exatamente o que eu quis por tantas e tantas vezes.
segunda-feira, 27 de setembro de 2010
Pequeno conto sem fadas
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
Um presente para a minha irmã
segunda-feira, 20 de setembro de 2010
De ninguém
domingo, 19 de setembro de 2010
Micro-explicação
sábado, 18 de setembro de 2010
Dez
quarta-feira, 15 de setembro de 2010
O dia em que você voltar
Eu sei que você vai voltar, mas não prometo te receber com o mesmo abraço. Muitas coisas mudaram por aqui. Desde o seu cinzeiro, que perdeu espaço na mesa, até a sua figura imponente, que não mora mais nas minhas lembranças. Não venha querer que eu seja a mesma que você deixou, porque tudo mudou desde a sua última partida.
Quando você entrar por aquela porta, arrependido pelos tropeços, pelos desacertos de uma vida desacreditada, deixarei que você fale o quanto precisar. Mas te lembrarei sobre a finitude do tempo, aquele tempo indomável em quem você me fez acreditar. Também te contarei sobre minhas últimas verdades, aquelas que você jurou que eu jamais faria questão de aprender.
Eu sei que você vai voltar e sinto diariamente os seus passos em minha direção. Não, não vou desviar com aquela covardia que você sempre guardou em si. Vou te receber com todas as certezas que tinha quando vi você descendo as escadas cambaleante, com mais dúvidas do que precisaria ter, com mais medos do que eu jamais tive.
O dia em que você voltar será um dia cinzento, cheio de nuvens, com um frio gelado que só os invernos mais rigoros são capazes de provocar. E então eu te darei a mão com ternura e te lembrarei porque você foi. Te farei sentar no sofá da sala e te observarei com cada centímetro da minha alma. Te olharei com o carinho de um tempo distante, aquele que não volta mais. Mas te pedirei desculpa por te deixar frente a frente com uma nova pessoa. Aquela que você destruiu. Aquela que você recompos.