segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Com licença *

Você sabe que o amor existe porque amou, porque foi amado ou porque viu ele se desenhar diante dos seus olhos.
Eu vivi e vi o amor.

Gostaria de compartilhá-lo com vocês.





*Licença pra falar de trabalho, que pela primeira vez me rendeu pastilhas. Pastilhas que eu adorei saborear.

* Vídeos produzidos por Jessé Giotti, para a série de três reportagens publicadas no jornal A Notícia entre 29 e 30 de novembro. Os textos são de minha autoria e estão disponíveis em www.an.com.br.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

De verdade

Com ele eu tive os meus melhores sonhos, frutos de noites muito bem dormidas, amaciadas por um abraço que foi meu porque eu deixei ser.
Como eram leves aqueles passos que dávamos juntos no meio da sala quando ele repentinamente me tirava para dançar, me fazendo ver todas aquelas estrelas que se aninhavam lá fora.
Com ele eu tive os melhores dias e as melhores noites de primavera, mesmo sem esperar que pudessem se estender além de uma estação.
Como era doce o jeito que sorríamos um para o outro nos momentos de total isolamento do mundo, trazendo para perto da gente um sentimento que nunca conseguiria adormecer.
Com ele eu aprendi a viver daquele jeito leve e intenso, uma contradição ambulante, tal como éramos nós, juntos ou separados.
Como eram firmes as nossas conversas. As que tivemos e deixamos de ter.
Com ele eu andei segura, passos ágeis, correndo pelo tempo que podia ir embora.
Como ele me fez bem apenas por estar ali, revolucionando as minhas rotas, quebrando meus cristais, derrubando minhas certezas, segurando a minha mão, me transformando.
Com ele eu voltei a ser o que sempre procurei em mim, fruto de incertezas, um verdadeiro moinho, uma explosão ambulante, uma mulher de verdade, que se jogou, que mergulhou, que se entendeu.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

STOP

Pare de buscar tantas certezas.
A arte de viver está nas dúvidas que você carrega.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Aparência

Ela tinha um cheiro tão doce, que não consegui dormir na noite em que a vi de longe, com um vestido de cetim cinza e um sapato vermelho que me lembrou o da Doroty, d'O Mágico de Oz. Fiquei pensando nas lembranças que aquele aroma suave me trazia. Ora parecia o de uma flor da minha infância. Ora me lembrava alguma-coisa-qualquer que eu registrei em uma caixa preta do meu cérebro tão seletivo.
Era a mulher mais linda daquele lugar, sem sombra de dúvidas. E eu, com 26 anos recém completos, me julgava um ser desprezível para aqueles olhos sintomáticos. Aqueles olhos que não precisavam ser verdes nem azuis para serem os mais perfeitos de-todo-o-planeta-terra-e-marte-e-vênus.
Será que ela sabe o que me causou quando deixou aquele bilhetinho com letras garrafais diante do meu copo de whisky nacional? Imagina o quanto meu coração deu pulos? O quanto me senti perdido, confuso e babaca diante de uma situação que mais parecia um sonho da minha infância?
"Me encontre as onze da noite. Moro na primeira rua à direita, numa casa amarela com cerca marrom, número 83".
As referências eram suficientemente esclarecedoras, mas eu não apareci.
Fiquei com vergonha de que não fosse comigo. Aquilo não podia ser verdade.
Duas semanas depois, encontrei-a de novo, com o mesmo sapato vermelho e um olhar de quem tinha mais certezas do que eu e do que o resto do mundo. "Eu estava te esperando. Você não apareceu. Queria conversar. Você pode ir lá hoje?".
Pronto, agora eu tinha certeza.
Deixei que fosse antes pois ela fez questão.
Tomei uma, duas, três doses de whisky nacional. Não era o meu preferido. Era o mais barato. A quarta dose eu encarei sem gelo, pra tomar coragem de encostar um dedo que fosse no corpo mais lindo que eu já tinha visto na vida.
Encontrei Rebeca com uma camisola fina, dessas que mulher usa para seduzir.
Toqueia- com cuidado e sem pressa.
Senti algo diferente na superfície da sua pele.
Fui descendo minhas mãos pelas suas costas com um certo desespero. Seu corpo era coberto de cicatrizes. Não eram uma, nem duas. Eram dezenas delas, desenhadas com um zelo que eu jamais me permitiria entender. Havia marcas no abdomem, nas coxas, nos ombros, no peito, no glúteo. Tudo escondido pelo cetim do vestido cinza. Tudo escondido pela camisola que ela escolhera para me receber.
Quando a dominei por completo, não consegui entender porque ela fizera aquilo. Imaginei que projetou o próprio corpo como uma tela em branco, que precisava ser preenchida. Depois, pensei que ela queria se mutilar para se tornar uma simples mortal, o avesso da perfeição.
Durante anos pensei em Rebeca como um ser obtuso, quase indecifrável. Por que ela me escolhera? O que esperava de mim? De onde vinham suas marcas?
Voltei muitas vezes ao mesmo bar a fim de encontrá-la. Nunca mais a vi. Confesso que temi a sua imperfeição. Seu cheiro não mostrava suas cicatrizes. Seus olhos omitiam todo o seu mistério. Mas eu toquei a sua essência como nenhum homem jamais se permitiu se apoderar de uma mulher. Aquela era a essência da dor. Eram as marcas da sua vida.

domingo, 21 de novembro de 2010

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

O melhor amor do mundo...

É aquele que não se deixou contaminar pela paixão.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

O último beijo

O beijo foi amargo porque tinha o gosto do que poderia ter sido e não foi.
Sentiu a perna tremer, o peito engasgar, o sonho acabar. Aquele momento seria o último e lhe traria a convicção da efemeridade das grandes e avassaladoras paixões.
Só quem abria os lábios para um último beijo sabia a significância daquele momento, da tensão da saliva, do movimento lento, sincronizado, que se permite dar adeus sem suspirar, sem encontrar o que procura no outro.
No começo era doce feito o mel. Não tinha certeza quanto ao gosto suave, mas tinha expectativas imediatas. Tinha planos. Tinha vontades. E tudo aquilo lhe habitava durante os intermináveis minutos em que suas bocas se encontravam num movimento tenso e apressado, com a pressa que move os apaixonados.
O doce ficara amargo porque passou a viver das dúvidas, das incertezas, dos medos. E concentrou mais angústias do que alívio, mais tensão do que calma, mais fuga, mais saudade.
Sabia ser o último beijo porque sentira aquele gosto amargo meses atrás, quando então se despediu de um amor que lhe trouxera as mesmas marcas. Reconhecia aquele tom ácido que se formava entre uma língua e outra, num prenúncio de dor e de lágrimas. Num prenúncio de adeus.
Decidiu que aquele seria o último beijo dos dois porque sabia que não conseguiria mais recuperar aquela doçura do primeiro encontro de lábios. Não queria mais sentir aquele gosto amargo - e frio - dos sonhos desfeitos, das chances que se perderam. O beijo dos covardes, que se despedem culpando-se pelos erros. O beijo do passado, que se deixa impregnar em cada parte do corpo, aguçando sentidos para aquilo que poderia ter sido, mas que, por um lapso qualquer, simplesmente não foi.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Sobre a relevância das (mil) lágrimas*

Passou tanto tempo sem chorar, que acabou esquecendo do gosto e da importância de uma lágrima. Permitiu que ela fluísse rápido. Arrancou cada gota de dentro de si. Sentiu o alívio dos dias de paz. Perguntou porque o tempo era de guerra. Aumentou o som e postou-se diante do espelho, firme como jamais estivera. Encontrou mais um pouco de sonhos naquele líquido quente que se apoderava da sua pele, do seu rosto borrado.
Chorar novamente, depois de tanto tempo, era a chance de que precisava para crer-se livre de uma angústia latente, que não raras vezes a deixava com mais dúvidas do que certezas. Naquele momento, as lágrimas eram mais poderosas do que o seu eterno-sorriso-que-podia-não-dizer-absolutamente-nada. Porque elas deixavam tudo limpo ali dentro, como se tivessem a missão de lavar seus dias nublados.
Depois daquele choro muito mais compulsivo do que impulsivo, passou uns dois ou três dias sendo reticente e cuidadosa com qualquer manifestação de alegria efusiva. Era essa a paz de que precisava agora, para entender aquele turbilhão de emoções que vinha crescendo vertiginosamente. Não sofria, não temia, não queria calmaria. Mas precisava libertar-se de algo que não sabia o que era. E descobriu rápido. Precisava libertar-se das lágrimas que a habitaram durante meses a fio. Por isso se deixou chorar. Por isso acordou em paz.

*Chore bem, pra rir melhor.

sábado, 13 de novembro de 2010

Eterno

Eu te deixei ir embora porque entendi que nem tudo existe pra ficar.

A bailarina

Dançou sozinha, no meio da rua, guiada por aquela música que só ele sabia cantar.
Jogou os braços de um lado pro outro, na tentativa de soltar o quadril e tornar a região da cintura menos rígida. Mexeu todo o tronco e depois conseguiu acelerar os movimentos, ainda que o som fosse um pouco mais lento do que os passos que conseguiu imprimir.
Parou repentinamente porque não conseguiu ir adiante. Seguir era um verbo impróprio naquele momento. Estava cansada das tentativas frustradas de pender prum ritmo que não era o seu. Dançou sozinha com os olhos fechados. Encontrou os melhores passos. Impôs o seu movimento. E finalmente conseguiu desprender-se do chão.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Bem-vindo você

É claro que eu não esperava que você chegasse justo hoje, num dia em que eu me encontrava desarrumada, de pijama, caída num canto da casa com livros por ler, discos por ouvir, histórias por contar. Você sabia que o portão da frente estava cadeado. E que a porta da sala de estar tinha uma chave que eu escondia. Seu único acesso foi pelo jardim de mudas que silenciosamente te aguardavam, mesmo sem saber.
Quando eu te vi tão pouco tímido, tão cheio de sí e de nós naquele pequeno vão que separa a sala do quarto, quis te perguntar quem você pensava que era pra se apoderar assim do meu espaço. Mas eu sabia. Você sabia. Nós sabíamos. Por isso permiti que você fosse chegando, entrando em todos os cômodos com esse jeito tão pouco modesto de derrubar o que vê pela frente. Por isso fingi que não vi sua entrada triunfal, como um rasante, como poesia, como uma surpresa que eu não aprendi a digerir.
Eu não pensei em te olhar no olho. Não planejei te convidar pra sentar. Não entoei uma canção de boas vindas. Mas eu permiti que você tomasse seu espaço e se fizesse presente em cada canto. Você regou todas as mudas que esperavam a sua chegada. Você abriu bem as janelas, deixou o sol entrar, o ar circular, o mofo ir embora. Você tomou tudo o que havia ali dentro e que parecia tão entregue antes da sua chegada.
Eu não quero que você vá embora nem amanhã, nem depois, porque você colocou tudo em ordem, mesmo me encontrando desordenada. Quero que você volte sempre que puder. E que fique tranquilo pra sempre, como eu sinto que vou ficar, mesmo que a sua passagem seja meio meteórica.
Mas me promete uma coisa? Deixe junto às plantas uma a gota mais de água. Deixe no chão da sala a marca do seu sapato sujo. Deixe no canto da mesa o rascunho daquela canção que você me escreveu. E mantenha a porta encostada sempre, pro caso de querer voltar.

domingo, 7 de novembro de 2010

Remédio

Pra quando você se arrepender do que não fez,
Pra quando você perder suas certezas,
Pra quando você tiver medo do improvável,
Pra quando você estiver a um passo de voltar,
Pra quando você cansar da chuva,
Pra quando você virar tempestade,
Pra quando você precisar,
Pra quando você renascer,
Pra quando você doer
só um remédio basta:
EXISTIR.


sexta-feira, 5 de novembro de 2010

X + Y

Quando eu tinha cinco anos de idade, não desgrudava do Carlos Eduardo. Sabe, mãe, aquele menino que me levava pro balanço e ficava cuidando pra eu não cair? Pois então, acho que ele foi meu primeiro amigo homem e eu juro que não consigo lembrar da nossa história de amor ter passado disso. Não, ele não se declarou pra mim, nem eu pra ele, quando nos demos conta que gostávamos de passar boa parte das nossas horas juntos, rindo e brincando, como se o mundo precisasse de pouco - ou de quase nada - a mais do que isso.
Depois veio o Copoquio, lembra? Ah, eu devia ter uns seis anos e mudei de escola. Logo, mudei de amigo também. Meu primeiro desejo foi ter uma lancheira igualzinha a dele, mesmo sendo de menino. Pouco importa esse detalhe de gênero. Se ele era meu espelho, meu exemplo, por que evitar essa atitude dramaticamente feminista e pós-moderna? Pois então, mãe, não lembro de termos pulado a cerca da amizade. Ficou naquilo mesmo. Um sentimento puro e inocente, como tinha que ser.
Eu fui crescendo e passei a odiar os garotos. Não queria nenhum amiguinho perto. Eles só sabiam falar de carrinhos, de super heróis, de futebol. Eram assuntos chatos. Eu queria mais era brincar de barbie, pensar cor de rosa, montar casas de boneca. Afinidade zero com esses meninotes que pareciam cada vez menores do que eu.
Mas depois, adolescente, teve o Juliano*. Sabe aquele, que senta do teu lado na escola e vai virando meio cúmplice? Pois então, esse mesmo. Passávamos horas falando sobre o nada, compartilhando um amontoado de crises e de histórias que só têm espaço na cabeça dos púberes. Ontem ele me lembrou que a gente chegou a se beijar acidentalmente. Eu preferia ter esquecido, pra sustentar a teoria firme e forte que vou manter por aqui, de que o amor entre um homem e uma mulher não precisa ser carnal, entende?
Com ou sem beijo, a minha amizade com o Juliano dura uma era. Calculo que mais de 15 anos, intercalados por momentos de silêncio, mas que subitamente não parecem nada toda a vez que a gente se encontra e ri como se tivesse sido ontem.
E aí que na faculdade, o Juliano escolheu um curso, eu escolhi outro, e eu conheci o Paulo*. Paulo era um menino que eu tinha tudo pra odiar: muito mais inteligente do que eu, sério demais, quase mudo. Mas quis o destino que virássemos vizinhos, compartilhássemos longas caminhadas e jantares e cervejas e conversas e filmes-cabeça e porres homéricos.
Só que um dia ele precisou ir embora e eu fiquei. Não, ele não foi embora pra perto. Tá tão longe, que é difícil até de mantermos contato virtual. Outro lado do mundo, sabe? Mas quando ele voltar, seremos vizinhos novamente. Ah, como é bom sonhar.
Depois do Paulo, teve o José. E o Júlio, o Marcelo, o Renan, o Tiago. Acho que depois desses aí, eu desaprendi a contar. Porque foram tantos, e tão importantes, que eu decidi parar de estabelecer números pra essa intrincada matemática que me leva a estar sempre cercada dos homens mais legais desse mundo.
Então, eu escrevi até aqui, só pra te dizer que sim, eu acredito na amizade entre um homem e uma mulher. Não só acredito, como cultivo com o melhor que existe em mim. Dou meus conselhos, minhas cotoveladas, saio e tiro eles do sério. Deito a cabeça no ombro, abraço com carinho, compro presentes e até me dou o direito de sentir ciúme uma vez ou outra. Brigo bastante também, mas acho que eles aprenderam a aceitar meu temperamento descontrol. E quando me leem aqui, são só elogios e orgulho. Melhor do que namorado. Melhor do que um irmão que eu nunca tive. Melhor amigo.

* Nomes obviamente fictícios

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Ela anda só

Entrou sozinha no bar, com um dos seus melhores vestidos, procurando uma mesa em que pudesse simplesmente sentar sem ser notada. Mas é claro que alguém iria percebê-la. Estava linda, exuberante, e absolutamente sem companhia. Pedia um, dois, três drinks e os homens não paravam de observá-la. O que passava pela cabeça deles naquele momento? "Por que ela não senta comigo?" ou "Será que está esperando alguém?".
Levou pouco mais de meia hora para que lhe pagassem uma taça de martini, bebida que ela não gostava por ser doce demais, contrapondo-se a sua personalidade meio amarga. "Aquele jovem lhe mandou isso", apontou o garçon. Riu timidamente e agradeceu com um aceno. Continuou seu diálogo com a solidão numa noite em que todos queriam companhia.
Lembrou das tantas vezes em que fora naquele mesmo bar em busca de conforto nos braços de um ou outro cara estranho ou da ilusão de que estar cercada de gente é menos dramático do que gostar de si mesma. Deu o primeiro gole na bebida que ganhara. Voltou no tempo e descobriu-se inacreditavelmente melhor.
Travou consigo mesma um longo e intenso diálogo. Estava só, muito mais bonita, madura e feliz, num bar em que todos procuravam desvendá-la, inclusive ela própria. Sabia que essa era a melhor opção agora: andar altiva e cercada da sua melhor companhia, que, naquele bar, era a cadeira vazia ao lado, o silêncio e o sorriso que conseguia brotar sem que alguém precisasse lhe fazer graça.
A meia-noite foi embora, caminhando devagar, com a leveza que o álcool acendia sobre o seu espírito cada vez mais livre. Chegou em casa entendendo mais sobre o mundo, convertida, com mil certezas e absurdamente em paz com seus últimos passos. Aquele tempo era dela e seria assim até que se descobrisse outra novamente.

*Apologia à solidão. Sim, às vezes todos precisamos dela.