terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Eis que ele estava sentado, balançando os pés, as mãos e o corpo inteiro, em um ritmo que desprezava seus oitenta e poucos anos. Os olhos verdes passeavam pelo mato e pelo mar, curiosos de um mundo que já lhe tinha apresentado tudo, ou quase tudo que queria conhecer. Respirou sutilmente o cheiro das folhas secas, da maresia. Postou-se diante dos pássaros, firme como um deles. Sonhador, voador.
Tinha, em todas as manhãs, a segurança da vida leve e o sofrimento da vida longa, aquela que lhe causava marcas, nódoas, cicatrizes intensas pelo corpo. Mas levantava-se e executava um rito, o rito do amanhecer, agradecer e viver, o mesmo que nos faz passar pelo mundo com coragem e altivez.
Falava baixinho coisas que não fazia questão que ninguém ouvisse. Murmurava saudades e filosofias. Abraçava lampejos de juventude, aquela que o corpo cansado não consegue acompanhar.
Um dia, levantou-se e foi embora. Aquele mundo não era mais dele, mas dos que ficaram. Ficaram para ser sua saudade. Ficaram para lhe lembrar.