quinta-feira, 3 de maio de 2012

Rio

Eram duas crianças. Ela bem mais do que ele. Insegura, pequenina, vazia. Mas tinham o dom de se fazer sorrir e por algum motivo fizeram bem um ao outro. Ele com uma graça particular, uma voz fina e um sotaque arranhado. Ela com os trejeitos infantis que hora ou outra se manifestavam em apelidos e brincadeirinhas de meninas. Conversavam de um jeito cômico aos olhos dos outros e apaixonado, romântico aos olhos deles.

Um dia ela decidiu crescer e incinerar aquele amor. Deixou-o ocupar um lugar vago nas lembranças, que foram se perdendo à medida que o futuro desenhava-se sóbrio, adulto, sensato e nú. Recordava de momentos singelos, como no dia em que viu-o chorar diante de uma conquista dela. E do momento em que se reencontraram depois de um silêncio que durou a eternidade.

Lembrou dele após vê-lo beijando o ombro de outra moça, em uma foto que parecia cartaz de filme. Era a tradução de uma felicidade que compartilharam um dia, e que agora tinha consolo nos braços de outra. E de outro. Era o tempo se manifestando e mostrando rugas.

Os amores da gente são como um rio correndo. Vão. Não voltam. Não permanecem. Mas mudam de temperatura, de paisagem, de profundidade. Mudam de intensidade e de cor. Olhar aquela foto e lembrar do tempo em que os dois rios se cruzaram foi um exercício de reflexão sobre a vida e sobre o que aprendera até então. Não sentia saudade. Apenas uma profunda sensação de cansaço do tempo. Apenas uma doce certeza de que o amor não era um fim. Era um meio. Era um rio.

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